sábado, 29 de agosto de 2009

Concursos públicos na berlinda: novas regras ainda geram dúvidas

O primeiro passo foi dado. Os concursos públicos finalmente contam com uma legislação específica – o Decreto 6.944, divulgado no Diário Oficial da União (DOU) no início da semana, que regulamenta as seleções no Executivo em âmbito federal. Dez decretos, que vigoravam antes, foram revogados e os procedimentos para a organização dos concursos públicos serão unificados.

Mas, apesar do avanço na busca pela transparência do setor, especialistas na área, proprietários de cursos preparatórios e os próprios concursandos veem falhas nas novas regras e acreditam que muita coisa acabou ficando de fora. A polêmica está lançada.Um dos pontos questionados é o direito de nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas oferecidas. O assunto não foi discutido na nova legislação, mas para Sylvio Motta, editor de concursos da Campus/Elsiver e diretor do curso Companhia dos Módulos, não haverá consenso sobre a questão. “Há casos e casos. Existem situações de dificuldade orçamentária da instituição que impedem a convocação, portanto, deve haver uma avaliação individual da situação”, afirma.

Sobre o tema, os candidatos têm uma grande aliada, a Justiça. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já deu parecer favorável para candidatos aprovados em concurso que não foram convocados e abriu precedente para decisões semelhantes.Mas esse é apenas um dos pontos do Decreto 6.944 que incomodam os especialistas. A possibilidade de abertura de seleção para formação de cadastro de reserva, mesmo em casos considerados excepcionais, é amplamente criticada. “É um processo altamente frustrante para o candidato”, avalia Motta. Para Maria Thereza Sombra, diretora executiva da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac), esse tipo de seleção deveria ser abolido. “Casos excepcionais, sem deixar claro quais seriam, não podem acontecer”, acrescenta. Se antes a definição das taxas de inscrição eram complicadas, agora estão ainda piores. “Normalmente, a média de cobrança era de um percentual de 2,5% a 5% da remuneração inicial do cargo, mas agora ficou em aberto. Pode ser qualquer valor, desde que se justifique como necessário para suprimento dos custos do concurso, o que dá mais insegurança e abre a possibilidade de enriquecimento ilícito das bancas”, avalia José Wilson Granjeiro, diretor-presidente do Gran Cursos. Para a advogada Marcela Armond Cota, que se prepara para o concurso do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG), além do valor, falta definir regras em relação à taxa de inscrição. “No caso de concursos que mudam a data da prova, como já aconteceu comigo, o candidato deveria ter opção de reaver o valor pago.

Muitas vezes, a prova acaba coincidindo com a de outras seleções e temos que optar por uma delas e, com isso, perder o dinheiro”, afirma.Outro aspecto em discussão é o prazo entre a divulgação do edital e a realização da prova. “Ainda não é o ideal, mas já houve muito avanço. Antes variava entre 30 e 45 dias, mas a nossa reivindicação é que sejam 90 dias”, avalia Maria Thereza. A mesma opinião é compartilhada pelos demais especialistas ouvidos.Segundo Sylvio Motta, para se alcançar maior transparência nos processos de seleção, é fundamental o estabelecimento de uma lei federal de abrangência nacional para definir os princípios básicos para licitação das bancas examinadoras. “O decreto não contemplaria essa decisão, que teria que vir por lei federal, mas é uma medida de extrema importância. Hoje, é muito obscura a definição da banca que será responsável pela seleção. Ninguém sabe os critérios utilizados”, afirma. O Decreto 6.944 passou a valer desde o dia de sua publicação, em 24 de agosto. Todos os editais publicados depois desse período ficam sujeitos às novas regras.

VEJA O QUE DIZ O DECRETO
O que muda.
O Ministério do Planejamento é responsável pela autorização de concursos do Poder Executivo, exceto aqueles para as carreiras de advogado da União, procurador da Fazenda Nacional, procurador federal, defensor público e diplomata.
O cadastro reserva será autorizado apenas em situações excepcionais, para atividades administrativas, de apoio técnico ou operacional.
O pedido de autorização para abertura de seleção deve incluir previsão de data para nomeação dos aprovados.
O Ministério do Planejamento poderá autorizar a nomeação de 50% mais aprovados do que o número de vagas, desde que as nomeações extras aconteçam dentro do período de validade do concurso.
Prazo de 60 dias entre a publicação do edital e realização da primeira prova do concurso. Mas o órgão poderá diminuir esse período mediante justificativa.
Informações sobre prazos, número de vagas e conteúdo programático são obrigatórias no edital de abertura.
Avaliações práticas, psicotécnicas e provas orais passam a ser consideradas como etapas do concurso.
A prova oral ou defesa de memorial deverá ser realizada em sessão pública e gravada para efeito de registro e avaliação.
A realização do exame psicotécnico será limitada à detecção de problemas psicológicos que possam vir a comprometer o exercício das Atividades inerentes ao cargo. É vedada a realização do exame para avaliação vocacional ou de quociente de inteligência (QI).
O valor cobrado na taxa de inscrição será fixado em edital levando-se em consideração os custos estimados para a realização do concurso. Além disso, deverão constar as possibilidades de isenção de taxa.
Foram fixados limites para a homologação de classificados: seleções com mais de 30 vagas poderão divulgar lista com o dobro do número de aprovados em relação ao número de postos indicados no edital

Pontos polêmicos.
Os candidatos aprovados continuam sem a garantia de nomeação dentro do número de vagas oferecidas.
O prazo de 60 dias entre a divulgação do edital e a realização da primeira prova é visto como um avanço, mas é considerado insuficiente. O ideal seria ampliar para 90 dias, mas ao contrário disso, ficou um brecha para redução do período.
A definição do valor da taxa de inscrição ficou ainda mais vaga. Agora, as bancas terão plena autonomia para o estabelecimento dos valores.
Concursos para formação de cadastro reserva ainda são condenados e muitos especialistas da área consideram que deveriam ter sido abolidos

O que ficou de fora.
O estabelecimento de regras claras e transparentes que defina os princípios básicos para a licitação das bancas examinadoras.
O estabelecimento de que, caso o edital sofra alterações, o prazo de 60 dias volte correr a partir da publicação das mudanças.
Dar publicidade ao nome dos membros da banca examinadora para aumentar a transparência da seleção .
Estabelecer o prazo para recurso do candidato, assim como a avaliação do pedido por uma banca superior, que não aquela responsável pela organização do concurso

Fontes: Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac), Gran Cursos, Maurício Trigueiro e Companhia dos Módulos
(Jornal Estado de Minas - 29/08/2009)

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